O Centro de Medicina Desportiva tem como destinatários atletas locais e pacientes transferidos pelos Serviços de Saúde (Foto: Leong Sio Po)
O diagnóstico e o tratamento de lesões fazem parte da missão do centro, diz Sérgio Conceição (Foto: Leong Sio Po)
O pessoal do Centro de Medicina Desportiva guia uma atleta em exercício de reabilitação (Foto: Direitos Reservados)
A nutrição é considerada crucial para apoiar o rendimento dos atletas (Foto: Leong Sio Po)
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A medicina desportiva não se deve resumir ao tratamento de lesões, pois desempenha também um papel crucial no dia-a-dia dos atletas, sejam eles profissionais ou amadores. Em Macau, o recurso a equipamentos modernos permite à equipa do Centro de Medicina Desportiva não só assegurar as melhores condições de tratamento, mas também apoiar o desempenho atlético
Texto Vítor Rebelo
São mundos distintos com uma paixão comum: a prática desportiva. Mas as necessidades dos praticantes de desporto profissional e amador são muito diferentes no que toca ao nível de cuidados médicos e é neste domínio que a medicina desportiva desempenha um papel essencial.
As cargas de treino e o nível de competição a que os atletas profissionais estão sujeitos nos tempos modernos exigem um apoio médico especializado e continuado. Considerada fundamental para o desenvolvimento do desporto, a medicina desportiva é direccionada para o diagnóstico e tratamento da patologia do desporto, assim como para o aconselhamento médico-desportivo, no âmbito do desporto de competição e de lazer. Não só promove a prevenção, o diagnóstico, o tratamento e a reabilitação de lesões, mas contribui para a optimização do rendimento desportivo.
Em Macau, onde o desporto é considerado um veículo de grande importância para a saúde e bem-estar da população, a prática da medicina desportiva acompanha a da medicina geral e, por isso, requer um envolvimento multidisciplinar.
Para Sérgio Rosário da Conceição, director do Centro de Medicina Desportiva (CMD) da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), o organismo tem evoluído rapidamente, com base num “leque variado de pessoal médico” e equipamentos modernos.
Pela sua estreita relação com a natureza da actividade física, há especialidades – como a ortopedia e a traumatologia, a medicina física e reabilitação e a cardiologia – que têm estado na primeira linha das necessidades dos desportistas profissionais. O Centro de Medicina Desportiva – uma subunidade orgânica do Instituto do Desporto (ID) localizada na Taipa – centraliza os serviços prestados, incluindo o diagnóstico de lesões desportivas, fisioterapia, medicina tradicional chinesa, psicologia do desporto e nutrição desportiva.
“O espaço oferece todas as condições que os atletas precisam, encontrando-se bem apetrechado”, salienta Sérgio Conceição, em entrevista à Revista Macau.
Entre mais de três dezenas de funcionários, o CMD possui um especialista em medicina desportiva, dois em medicina geral, um em medicina tradicional chinesa, uma psicóloga, três dietistas, seis enfermeiros, nove fisioterapeutas e um massagista. “O número e a competência destes especialistas responde às exigências dos dias de hoje, no que diz respeito às necessidades do desporto local”, explica o responsável.
Maior exigência
Segundo Sérgio Conceição, a evolução que o centro tem tido corresponde ao desenvolvimento da medicina desportiva mundial e ao próprio desenvolvimento do desporto em Macau. “Actualmente, o desporto local tem muito mais qualidade e, por isso, um maior grau de exigência, ao qual o CMD tem procurado responder da melhor forma, quer no desporto de alto nível, mais profissional, quer no amador, contando sempre com o apoio do Governo, através do ID”, acrescenta.
O diagnóstico e o tratamento de lesões fazem parte da missão do centro, diz Sérgio Conceição (Foto: Leong Sio Po)
Para responder às exigências actuais do desporto da RAEM, foi criada uma extensão do CMD no Centro de Formação e Estágio de Atletas – localizado no Cotai –, que é um complexo disponível para atletas de alto rendimento, ou seja, vocacionado para a alta competição. Médicos, fisioterapeutas e um preparador físico, alguns dos quais se deslocam do centro da Taipa, providenciam cuidados especializados aos atletas de elite da RAEM.
“Os dois espaços completam-se, mas há tratamentos específicos de terapia que apenas existem no complexo de alto rendimento, porque este é mais moderno, mais avançado, com aparelhos mais sofisticados, para, por exemplo, treino dos músculos intrínsecos, mais usados por atletas de certas modalidades, como saltos para a água”, salienta Sérgio Conceição.
No caso de atletas profissionais, ou semiprofissionais, o tratamento de lesões é feito tanto pelo método convencional, como através da medicina tradicional chinesa. “Não há, digamos, uma preferência, e, por vezes, até se utiliza uma combinação dos dois”, indica o responsável.
“O que eles querem é que seja o mais rápido possível, para regressarem ao treino e à competição”, frisa, reconhecendo que a medicina tradicional chinesa tem ganhado cada vez mais seguidores, concretamente a acupunctura e o “cupping”, também conhecido por ventosaterapia, uma prática que utiliza copos de vidro ou plástico para criar vácuo na pele, a fim de melhorar a circulação sanguínea em pontos específicos do corpo, diminuindo igualmente a dor e provocando uma acção relaxante.
Tecnologia de ponta
No centro, as práticas tradicionais são usadas lado a lado com tecnologia de ponta e técnicas inovadoras, realça Sérgio Conceição. O espaço no Cotai, por exemplo, dedica uma grande parte do seu funcionamento à reabilitação, dispondo de vários aparelhos para exercícios diversificados e oito salas privadas. Estas salas estão equipadas com aparelhos para terapia de ondas de choque, ventosas e ultra-som. No espaço de maior dimensão, no piso superior do CMD, podem ser atendidos em simultâneo 16 pacientes.
“Os tratamentos usam equipamentos semelhantes nos dois locais, mas, no aspecto da reabilitação, o espaço do Cotai tem aparelhos um pouco mais avançados, num ginásio muito bem apetrechado”, diz o director do CMD.
Entre os equipamentos, o director da unidade médica destaca um, “altamente sofisticado”, adquirido no ano passado e proveniente dos Estados Unidos da América: um tapete antigravidade.
“O tapete é o único que existe em Macau, sendo extremamente eficaz para reduzir o peso do corpo”, diminuindo a carga e o impacto sobre as articulações e os músculos durante o exercício, observa Sérgio Conceição.
“Para um atleta que pesa, por exemplo, 200 quilos, o sistema antigravidade disponibilizado pelo aparelho pode fazê-lo atingir até metade do peso.” Isso significa, acrescenta, “menos impacto no membro inferior em tratamento, nos dedos ou no tornozelo, e uma recuperação mais rápida para os atletas”.
O CMD trata tanto de lesões pequenas como de mais graves, sendo as mais comuns as do joelho, costas, pescoço e tornozelo, de atletas que provêm tanto de modalidades colectivas como de individuais. No primeiro caso, a maior incidência de lesões acontece no futebol. No segundo, nas artes marciais, como karaté, taekwondo, wushu, mas igualmente na esgrima e na natação.
“Tratamos essencialmente lesões médias, como entorses e rotura do menisco, ou rotura do ligamento anterior ou posterior do joelho”, sublinha Sérgio Conceição, formado em Ciências do Desporto nos Estados Unidos, onde completou um curso de fisioterapia.
O pessoal do Centro de Medicina Desportiva guia uma atleta em exercício de reabilitação (Foto: Direitos Reservados)
De entre os últimos anos, 2024 foi o que registou maior atendimento de atletas na especialidade de fisioterapia, tendo 8000 pessoas recorrido aos serviços do CMD. De acordo com o responsável, só foi possível ao centro atender tantos pacientes porque houve um maior recrutamento de fisioterapeutas em 2021.
“Para já, o quadro de fisioterapeutas está completo e a situação está controlada, mas se o número de praticantes e os eventos desportivos aumentarem, então teremos de contratar mais especialistas”, constata Sérgio Conceição.
Testes anti-doping
Em 2017, foi assinado um protocolo com a China Anti-Doping Agency (CHINADA, na sigla em inglês), que providenciou maiores valências ao CMD, nomeadamente no que toca a controlos antidoping, destaca o seu director. “São eles que nos ajudam na parte dos serviços de laboratório, aquando, por exemplo, da Maratona Internacional de Macau, com as análises feitas aos atletas no estádio e enviadas para a Universidade de Desporto de Pequim”, refere.
Sérgio Conceição revela que “muitas das provas internacionais realizadas na cidade”, como a Maratona Internacional e o Grande Prémio de Macau, “são controladas pelas respectivas federações e são estas organizações que pedem o controlo antidoping”.
Muitas vezes, esse controlo é feito de surpresa e por sorteio, antes, durante e depois das provas, como aconteceu na última Taça do Mundo de Ténis de Mesa e como habitualmente sucede com algumas modalidades, em especial as de “endurance”. O mesmo acontece nas participações de Macau em competições multidesportivas, nomeadamente nos Jogos Asiáticos.
Para colheita das análises, o CMD possui os seus próprios funcionários, médicos e enfermeiros, num total de 16, todos locais, formados pela CHINADA. Mas Sérgio Conceição considera que os atletas estão cada vez mais a afastar-se do doping. “Os sistemas de controlo antidoping estão muito avançados e, por isso, os casos têm diminuído bastante”, salienta.
Este tópico tem sido debatido nos seminários e cursos de formação na área da ciência do desporto organizados pelo ID. Os colóquios “são muito importantes para sensibilizar os atletas para vários aspectos da prática desportiva, entre os quais a essência da consulta, cujo objectivo é saber quais são as condições que o corpo tem para praticar determinado desporto”, explica o director do CMD.
Nutrição “fundamental”
A nutrição é outra das áreas a que o CMD tem prestado cada vez mais atenção, dispondo de um gabinete de atendimento e aconselhamento onde salta aos olhos de quem entra a célebre “pirâmide dos alimentos”. Angela Wong, uma das três dietistas do centro, considera “fundamental” nos dias de hoje um atleta saber o que deve comer e beber, para se manter saudável e até para evitar desidratações durante a prática desportiva.
A nutrição é considerada crucial para apoiar o rendimento dos atletas (Foto: Leong Sio Po)
Aproveitando a experiência que o CMD tem também nesta matéria – e tendo em consideração as necessidades da população em geral –, a unidade de medicina desportiva instalou, desde Junho, 15 postos em zonas comunitárias da cidade. Nos postos irão estar dietistas e fisioterapeutas do CMD.
“O objectivo é privilegiar o contacto com a população, oferecendo os nossos conhecimentos para ensinar as pessoas a fazerem uma boa nutrição, assim como, ao mesmo tempo, aprenderem sobre as vantagens da fisioterapia”, salienta a nutricionista.
Segundo Sérgio Conceição, o CMD deverá ser transferido para o complexo no Cotai, “provavelmente daqui a três ou quatro anos”. A ideia, destaca, “será centralizar tudo no mesmo complexo, que oferece excelentes condições de treino e tratamento”, dispondo, entre outras áreas, de um dormitório para a realização de estágios e uma cantina com um menu apropriado para corresponder às necessidades de nutrição dos atletas de alta competição.
O director do CMD recorda que o centro terá um papel importante a desempenhar durante a 15.ª edição dos Jogos Nacionais, que decorrerá em Novembro e que será organizada de forma conjunta por Guangdong, Hong Kong e Macau.
“Vamos ter uma equipa médica em Macau para tratar os atletas das nossas e das restantes selecções, em colaboração com os Serviços de Saúde, e também poderemos fazer deslocações a Hong Kong e Guangdong, caso haja representantes da RAEM em provas nesses locais, enviando médicos e terapeutas”, avança Sérgio Conceição.
O responsável tem como principal meta a médio prazo a concretização da passagem de todos os serviços para o Centro de Formação e Estágio de Atletas, no Cotai. “Espero que isso seja uma realidade e que o complexo possa continuar a dispor dos melhores equipamentos, acompanhando a evolução tecnológica neste domínio”, ressalva. Só assim “os atletas de Macau podem desfrutar dos melhores serviços, progredir física e mentalmente, diminuindo a pressão durante as competições, e, como consequência, contribuir para o desenvolvimento do desporto na cidade”.